terça-feira, 29 de abril de 2014

Raízes

Este fim de semana troquei as voltas ao pessoal do trance, ao pessoal do punk e todos os convites de manifestações do 25 de Abril.
Numa terra em que o sentido de liberdade e de revolução já passaram há muito, numa terra em que por muitos anos que passem o sentido de Fátima, Fado e Futebol ainda continua a vigorar embora camuflado, mas á vista de todos, decidi que a maior revolução que alguém pode fazer é amar quem nos ama e quando esse amar já se encontra distante, a vontade de revolucionar uma visita se torna cada vez mais forte decidi rumar a uma terra chamada Alvorge, uma terra única, de gentes do campo, num Portugal remoto, como são os meus parentes maternos.

Não quero com isto fazer jus ao que disse acima, nem tecer discursos paternalistas, mas quer queiramos, quer não, todos nós temos as nossas raízes.

Numa terra em que os mais novos e cada vez mais novos tentam outras oportunidades além Portugal, encontrei os meus tios e primos de surpresa, quando de um dia para o outro, liguei á minha mãe e lhe disse: - Mãe, vamos á terra!?
Em poucas horas se ouviu um tremido sim na sua voz saudosa e assim o fizemos. Partimos depois de almoço e pouco tempo depois batiamos á porta da minha tia Laura, uma mulher de fibra tal como todas as outras que de trabalham horas a fio na eira e a cuidar do gado.

Nessa terra, onde ainda hoje se conquista o pão pelas mãos enrugadas e queimadas do sol e onde se faz um queijo delicioso que provém das ovelhas e das cabras que pasteiam pelo campo.
Na terra onde ainda hoje se recorre ás plantas silvestres e selvagens para alimento, ás rezas pelas alminhas do mau olhado ou ás mézinhas para quando se está doente, uma remota terra das bruxas no concelho de Leiria onde esvoaçam corvos a cada curva da estrada.

Ao ver-nos, a alegria era geral e em pouco tempo os 10 anos que passaram desde a minha última visita parecia me um nanosegundo só de os poder abraçar.
Aquele abraço fraterno a quem muito nos quer bem.
A alegria de conhecermos os novos membros, como a Solange que ficou radiante por conhecer as novas primas e que tanto quis ficar para viver.
Talvez um dia, se a vida assim o ditar.

O que quero dizer com isto tudo é que numa aldeia dominada pelas superstições, pela religião, pelas curandeiras de almas, encontramos gente que ainda vive em comunidade, que dão ao sentido união o sabor do mel, outrora nómadas por questões de sobrevivência, felizes na sua simplicidade de viver, onde o pão hoje não falta, mas que foi devastada pela misèria de mais de quarenta anos de ditadura.

Relembro os tempos em que corria pelas veredas da fonte, da chinchada nas vinhas do vizinho, nas voltas de motorizada com o meu primo Fernando e das festas populares em que os rapazes me convidavam para dançar aquelas modinhas que hoje não me fazem sentido.

É através destes parentes e das nossas diferenças ideológicas que hoje reforço o valor da igualdade, do sentido de respeito pelos mais velhos, os anciãos da força, da alegria e da imensa sabedoria que transmitem só de identificarem uma simples flor ou uma erva esquisita desconhecida para mim.

É através destes parentes (e suponho que muitos de nós também os tem) que dou valor á união, aos valores que me constroem como individuo, aos principios, ás raízes que desde pequena guardo apenas os que me fazem sentido.

A familia, não a familia que Salazar impunha, mas a familia que nos recebe, sejam de sangue, sejam do peito.

A familia não é uma doença, nem um mal necessário é uma dádiva que nos faz pensar no verdadeiro sentido da vida, que nos faz distinguir muito bem o trigo do joio.

A prima de Lisboa como sou conhecida não é mais evoluída, nem mais moderna, nem mais á frente, a prima de Lisboa é uma Mulher igual a tod@s vós, porque somos todos iguais e onde somos todos diferentes e é a aceitar essas grandes ou pequenas diferenças que reside o verdadeiro sentido de Liberdade.

A Liberdade de sermos grandiosamente Nós, inseridos num pequeno Eu.

Um grande bem haja á minha familia e á familia de todos vós, sejam quem forem ou de onde vierem.


Deixo algumas memórias que fotografei no parco tempo que por lá andei.



1565 - Data de construção de uma pequena capela na aldeia do Alvorge.


A minha avó, que tal como antigamente, come a sua sardinha, desta vez inteira, onde há mais de 60 anos atrás teria de dar para 5 filhos.


As berças, as ervas que crescem selvagens no campo que  fazem parte da alimentação de quem lá vive, não provei, mas dizem-me que é uma iguaria daquelas...



Os queijos feitos pelas milagrosas mãos da minha tia Laura... só de ver, já salivo...


Não há festa sem vinho e este acabou em pouco menos de uma hora.



O meu tio Mário e o seu tractor das lides


As primas que nunca te tinham visto e que adoraram o tempo juntas.










E por fim, a união de mais de 45 anos de casados.
Relembro a minha tia e a sua expressão que nunca tinha ouvido: "Mulher de bigode, não é Mulher de pagode!"
Foi lindo ver in loco que após tantos anos de vida em comum, ainda é visível sem pudor nos olhos deste Homem a paixão que nutre pela sua companheira de vida e de trabalho  que me disse: "Como se tivesse sido hoje o dia em que a conheci"


E fico-me por aqui, pois muito mais haveria para contar...

















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